Algo me diz que «Flight»
não será lembrado por muito tempo.
Não é que o filme não
seja bom: é MUITO bom até. Mas enquanto o tema da auto-aceitação e redenção é
particularmente comovente, o mesmo já não pode ser dito do «embrulho» em que é
entregue.
Por exemplo, «American
History X» e «The Wrestler», de uma forma ou doutra são filmes que tratam do
mesmo assunto: os vícios apaixonantes que corrompem o espirito humano e o
deixam apodrecido na berma da estrada. «Flight» é parecido com ambos em vários
aspectos (grande performance central, personagens secundárias coloridamente
desenvolvidas, detalhes de realização impecáveis…), menos na maneira como nos
faz sentir «encaixados» com a personagem principal e as suas decisões: é
complicado simpatizar com um bandalho.
Whip Whitaker (Denzel
Washington) está brutalmente bêbado, drogado e vai pilotar um avião cheio de
passageiros. Quase chegando ao destino, uma avaria ocorre, levando Whip a
seguir os seus instintos (completamente «cocaínados») e a tentar uma manobra
inédita no mundo da aviação. A maior parte dos passageiros sobrevive e o piloto
é aclamado como herói nacional: isto até surgirem análises ao sangue feitas
logo após o acidente...
E adivinha: os pilantras
da inspecção não querem saber se pilotas aviões com colesterol alto! Já ninguém
zela pelo bem-estar das pessoas hoje em dia…
Robert Zemeckis (Back to
the Future, Forrest Gump) regressa às películas «de carne e osso» depois de 12
anos a «brincar» com imagens animadas (Beowulf e Polar Express são exemplos).
Bem, parece que «quem
sabe, não esquece» e «Flight» é mais um marco na carreira de um realizador que
continua a amadurecer. É um retrato humano poderoso, construído com consciência
e «evocando» a reação desejada do público: no entanto não poderia estar mais longe
da sensação de alegria de viver exaltada em «Forrest Gump».
A felicidade aqui surge
apenas de forma artificial.
O voo (peça fulcral do
filme e um exemplo de execução cinematográfica perfeita, combinando
desenvolvimento de personagem, efeitos especiais de cortar a respiração,
representação de topo, realização e cinematografia prodigiosos, diálogo
inspirado,…) mimica a espiral descendente e ascendente das duas personagens
principais.
Washington é fantástico,
oferecendo-nos acesso livre à alma deste homem torturado pelas próprias
escolhas.
«Eu tenho uma ex-mulher e
um filho com quem nunca falo! E sabes porquê? Porque eu escolho beber!»
E controla-se: o seu
controlo é tão evidente que Zemeckis afasta a câmara, aumentando o suspense e a
tensão. Existe um momento claro no filme em que a implosão ocorre de uma
maneira tão absolutamente brutal que chega a tornar-se comédia negra.
Se esse registo se
mantivesse estaria a olhar para «Flight» de maneira diferente. Mas o final é
mais humano do que alguma vez poderia ter esperado. Ou
então não: afinal de contas este ainda é um filme do gajo que pôs o Marty McFly
a salvar o pai do Biff, não é?
O meu problema com o
filme, é que não nos afeiçoa de maneira nenhuma ao protagonista: ele é pura
escumalha e orgulha-se disso! Como é que é suposto rejubilarmos quando ele faz
algo de bem, ou sentirmos pena quando faz algo de péssimo?
Mais: as personagens da
drogada e do filho parecem estereótipos dos grupos sociais a que pertencem…
Para mim, simplesmente não funcionaram.
E falando nela, Kelly
Reilly é-nos mostrada a ter uma overdose ao mesmo tempo que o avião se
despenha… Não seria mais interessante que esta conexão se continuasse a
verificar ao longo da história?
São estas pontas soltas
que ficam pouco esclarecidas e baixam a magnificência que nos é apresentada.
Contando com John Goodman
(hilariantemente instável), Don Cheadle (inteligente e infatigável) e uma banda
sonora que nos leva gloriosamente de volta aos anos 70, sem dúvida que Simon
Says that this movie is …
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