Eu vejo muitos filmes.
E
quando chega aquela altura do ano em que «os bons» começam a aparecer, é-me
fácil ignorar os comentários habituais de «AH! Este filme é o melhor do ano!»
ou «Nunca vi nada assim! Tens mesmo de ver!». Ultimamente então, com as gentes
das redes sociais a proclamar «Malavita» como um dos melhores filmes de sempre,
o meu cepticismo faz-me entrar em modo rejeição e ignoro qualquer conselho.
Arrependo-me
profundamente de dizer que aconteceu o mesmo com «Gravity».
Eu poderia passar um
parágrafo a dizer o quanto eu detesto o George Clooney por fazer sempre a mesma
personagem, ou que embora tivesse fé no trabalho do realizador Alfonso Cuarón,
nunca fui um fã acérrimo... Como raio haveria eu de sonhar que o gajo por trás
de «Children of Men», «Harry Potter and the Prisoner of Azkaban» e «Y tu mama
tambien» teria estofo para explodir o mundo dos efeitos-especiais da mesma
forma que George Lucas o fez com «Star Wars»?
Admito: eu estava errado
ao duvidar. E agora me ajoelho perante si, poderoso realizador, prestando uma
solene e sentida homenagem. Sei que demorei, mas mais vale tarde que nunca.
Ryan Stone (Sandra
Bullock) e Matt Kowalski (Clooney) são apanhados numa chuva de detritos
provenientes de um satélite que explodiu. Estando à deriva no espaço e com a
sua nave destruída, têm de tentar fazer caminho para outra nave antes que
fiquem sem oxigénio ou combustível.
A história é uma simples
luta pela sobrevivência, não empregando longos desenvolvimentos de personagem:
e para quê? A psique humana tem determinados instintos intrínsecos, que são
activados sem a nossa percepção racional. O instinto de sobrevivência é um
deles: e posso atestar que o meu esteve a trabalhar a 200% durante toda a
duração desta obra de arte. Desenvolvimento é aquilo que te faz respeitar,
interessar e temer por determinada personagem. No entanto, descobri que se te
emergires na acção (deste filme em particular) e conseguires sentir a mensagem
do realizador a passar, de que estás REALMENTE LÁ sozinho com estas pessoas, a
passar por estas tribulações infindáveis, tens todos os elementos necessários
para te sentires responsável pelo que lhes está a acontecer.
Vi o filme em 2D e
simplesmente não consigo deixar de pensar que teria de levar um ou mais baldes
para vomitar caso o fosse ver em 3 dimensões. A cena de abertura do filme tem
aproximadamente 17 minutos, e nem um corte (visível). Fazem ideia do que é
passar quase 20 minutos interruptamente à deriva no espaço, rodopiando com o
raio da câmara por todo o lado? Eu nem imagino o tempo que demoraram para a
montar, mas a sua complexidade é monstruosa: e duvido que o próprio Stanley
Kubrick (inovador dos filmes espaciais através de «2001: A Space Odissey»)
conseguisse descobrir o segredo por detrás de tão fantástico trabalho.
As tuas sensações podem
ser diversas: enjoo, preocupação, incerteza, medo, alivio, frustração e até
mesmo coragem! Tudo isto porque estás ao lado de Sandra Bullock, que nunca foi
uma das minhas actrizes favoritas, mas merece toda a tua confiança durante os
90 minutos desta odisseia. Senti-me impelido a ajudá-la, a dar-lhe a mão, a
gritar-lhe para se apressar, para respirar mais devagar e a pensar com mais
calma. Dei por mim a cerrar os punhos e a contrair os dedos dos pés. Quando um
filme tem esse efeito, eu sei automaticamente que já estou convencido. Não
acontece o mesmo contigo?
Existe sempre pelo menos
uma cena nos filmes de Cuarón que celebram a vida em contraste com a morte.
Lembro-me da que está presente em «Children of Men», quando a protagonista revela
o seu corpo no meio de vitelos, enquanto pede ajuda. Também em «Gravity» existe
esse momento, em que Ryan se liberta da prisão em que estava, deixando-se
flutuar sem gravidade enquanto a luz do Sol se esbate nos seus contornos. É
como ver um embrião no ventre da mãe, iluminado pela esperança de nascer:
maravilhoso, belo e arrepiante.
Tal força só consegue ser
duplicada durante a cena final, em que, mais uma vez, a metáfora do
(re)nascimento ergue o nosso espirito para lá da atmosfera, para as estrelas,
onde nos deixamos ficar a flutuar com a orquestra que se tornou sinónimo de vida
nas nossas mentes e corações.
Ah… Como é bom existir.
Simon Says that this movie is...
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